sexta-feira, 1 de julho de 2011

Comentário sobre o filme documentário Atlântico Negro –" Na Rota dos Orixás"


            Na Rota dos Orixás, Brasília, 1997, dirigido por Renato Barbieri
       
           O documentário trata das relações histórico-culturais entre Brasil e África, especialmente no aspecto da religião dos Orixás.
            O referido trabalho apresenta boa qualidade técnica e uma linguagem que facilita o entendimento para qualquer público que o assista. O documentário informa sobre a grande dispersão que houve de escravos africanos para o nosso continente utilizando o denominado “Atlântico Negro”, dando a noção de interligação entre a cultura africana e os afro-descendentes das Américas, principalmente os do Brasil. Esse novo prisma coloca nossa herança cultural européia e africana no mesmo nível.
            Com a globalização, o mar atlântico que era considerado um grande divisor de fronteiras, associado com o recorte do tráfico, agora é visto como uma nova ligação cultural, com poder de articulação para um diálogo consciente e um relacionamento com a sua história.
            O documentário inicia-se com o líder religioso brasileiro Pai Euclides se comunicando com o líder religioso beninense, o vodunon Avimanjenon, através de vídeo. Outros recursos usados são: narração, comentários de entrevistados, imagens de rituais, festas, representação histórica e vínculos culturais, intercalando o Brasil e o Benim.
            Além disso, são enfatizados três temas: a religião dos Orixás, o tráfico e a comunidade Agudá (descendentes de escravos africanos que retornaram á África).
O documentário apresenta pareceres dos historiadores brasileiro e beninense Alberto da Costa e Silva e Emanuel Karl, respectivamente, dando informações sobre o sistema escravocrata na Costa dos Escravos nos séculos XVIII e XIX.
            A polemica figura do baiano Félix de Souza, o “Crachá” também é mencionada no documentário. Ele foi o maior traficante de escravos de toda a história do século XIX. Estabeleceu-se em Uidá construindo um império comercial com ajuda do rei do Daomé Guêzo, deixando uma enorme e rica descendência (comentada pelo fotógrafo e antropólogo Milton Geron.
O entrelaçamento cultural também é destacado através de comparações entre festividades praticadas pelos Agudás e pelos brasileiros, como a festa da Burrinha com especiais afinidades com o Bumba Meu Boi realizado no Maranhão.  No carnaval dos Agudás também aparece o forte traço cultural ligado ao Brasil.
 Isso demonstra a troca de culturas oriundas do tráfico, pois os africanos quando vieram para o Brasil, trouxeram consigo, além das tradições religiosas, as culturais, da mesma forma que levaram para a África as tradições assimiladas no Brasil. Um exemplo disso é a influência da arquitetura brasileira, claramente demonstrada na construção de uma mesquita em Porto Novo. A construção tem todas as características das igrejas católicas construídas na Bahia.

Segundo NICOLAU (1998-1999), o documentário não possui uma fidelidade etnográfica, como na passagem em que o narrador fala de Exu e as imagens mostram o Vodum, ou, ainda, quando são apresentadas imagens justapostas do bloco Ilê Aiye com as da festa religiosa de Tambor de Minas, no Maranhão. Isso é detectado apenas por especialistas participantes ou estudiosos dessa religião e pode causar questionamentos.
A produção do documentário procura demonstrar parte do cotidiano dos habitantes da África através da festa dada pelos Agudás em Uidá ao receber a equipe da filmagem, utilizando-se de artifícios de ficção para retratar esse cotidiano. Ainda que possa ser duvidosa a espontaneidade dos participantes, uma vez que estavam cientes de que estavam sendo filmados, é importante essa passagem para inserir ao conhecimento sobre a África e seus habitantes, os Agudás.
Os produtores mais uma vez usaram de manipulação para representar a admiração mútua entre os povos desses países quando apresentam o envio de um suposto presente  do líder religioso Avimanjenon a Pai Euclides – um bastão cerimonial que foi recebido de forma ritual. Esse bastão, na verdade, não foi um presente enviado pelo líder religioso Agudá, mas sim comprado pelos produtores do filme.
Os produtores do documentário souberam expor as imagens e as informações de uma forma muito abrangente, e mesmo com as manipulações decorrentes da edição, narrativa e apresentação das cenas, o discurso se tornou legítimo.
Apresentado de uma forma compacta, o documentário atinge seu objetivo principal que é produzir documentação de uma história até pouco tempo não vista e não apreciada, mas que hoje é de extrema importância para que os afro-descendentes tenham acesso às suas origens.
Como matéria obrigatória em sala de aula, a história da África conta com esse documentário como um importante instrumento educativo.
  
REERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BARBIERI, Renato. Atlântico negro – a rota dos orixás, Brasília, 1997. Filme documentário 35mm., color. Duração: 53 min., 41 seg. Diretor: Renato Barbieri. Projeto e roteiro: Victor Leonardi e Renato Barbieri. Idealização e realização: Videografia; Instituto Itaú Cultural. Patrocínio: Ministério da Cultura; GDF-SCE; Pólo de cinema e vídeo do DF; Fundação Cultural do Distrito Federal.

NICOLAU, Luis. Revista Afro-Ásia, 21-22, 1998-1999, 367/375 

Mirna Galesco Dias – História da África – Profº Artur J. Vitorino

Um comentário:

  1. SEM PALAVRAS...SÓ ME RESTA DE CORAÇÃO, DIZER:
    PARABÉNS...PARABÉNS...PARABÉNS...!!!

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